CINCO coisas que você como Operador do Direito não pode desconhecer sobre as MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA da LEI MARIA DA PENHA
Por Fábio Gesser Leal
1 - A palavra da vítima basta para a concessão de Medidas Protetivas de Urgência. Realmente, em se tratando de casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, a palavra da vítima ganha especial relevo para o deferimento de Medidas Protetivas de Urgência, porquanto os delitos relacionados são cometidos, em regra, na esfera da convivência íntima e em situação de vulnerabilidade, sem que sejam presenciados por outras pessoas. E assim é que, em estando em conflito, de um lado, a preservação da integridade da vítima e, de outro, a irrestrita liberdade, em seu amplo aspecto, do suposto agressor, atende aos mandamentos da proporcionalidade e da razoabilidade a decisão que aplica medidas de restrição de direitos contra este último, tendo por base o relato da primeira. Nesse sentido: STJ, AgRg no AREsp 213.796/DF, Rel. Ministro CAMPOS MARQUES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/PR), QUINTA TURMA, j. 19/02/2013; STJ, RHC 34.035/AL, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, j. 05/11/2013.
2 - Não há necessidade de boletim de ocorrência, de inquérito ou de processo cível ou criminal para que sejam requeridas e concedidas Medidas Protetivas de Urgência. De acordo com o Tribunal da Cidadania: "As medidas protetivas previstas na Lei n. 11.340/2006, observados os requisitos específicos para a concessão de cada uma, podem ser pleiteadas de forma autônoma para fins de cessação ou de acautelamento de violência doméstica contra a mulher, independentemente da existência, presente ou potencial, de processo-crime ou ação principal contra o suposto agressor. [...] Nessa hipótese, as medidas de urgência pleiteadas terão natureza de cautelar cível satisfativa, não se exigindo instrumentalidade a outro processo cível ou criminal, haja vista que não se busca necessariamente garantir a eficácia prática da tutela principal. 'O fim das medidas protetivas é proteger direitos fundamentais, evitando a continuidade da violência e das situações que a favorecem. Não são, necessariamente, preparatórias de qualquer ação judicial. Não visam processos, mas pessoas' (DIAS. Maria Berenice. A Lei Maria da Penha na justiça. 3 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012) [...]" (REsp 1419421/GO, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, j. 11/02/2014).
3 - Há possibilidade de que, em breve, a Autoridade Policial possa diretamente conceder determinadas Medidas Protetivas de Urgência. Na sistemática atual, a concessão de medidas de proteção da Lei Maria da Penha é exclusividade do Magistrado. Quando a ofendida busca amparo na Delegacia de Polícia, seu pedido de Medidas Protetivas de Urgência deve ser encaminhado pela Autoridade Policial em 48 horas (art. 12, III, da Lei n. 11.340/06) e o Juiz deve decidir em também 48 horas (art. 18, I, da Lei n. 11.340/06). No entanto, o Senado Federal aprovou, em 10/10/2017, projeto que altera a Lei Maria da Penha para permitir que o Delegado de Polícia conceda certas Medidas Protetivas de Urgência a mulheres vítimas de violência doméstica e familiar e a seus dependentes. Nos termos do Projeto de Lei (PLC 7/2016), verificada a existência de risco atual ou iminente à vida ou integridade física e psicológica da vítima ou de seus dependentes, a Autoridade Policial, preferencialmente da Delegacia de Proteção à Mulher, poderá aplicar provisoriamente, até deliberação judicial, as Medidas Protetivas de Urgência previstas no inciso III do art. 22 e nos incisos I e II do art. 23 da Lei n. 11.340/06, intimando desde logo o ofensor. O texto do projeto em comento seguiu para a sanção presidencial. As opiniões a respeito do viés positivo ou negativo da mudança, não obstante, são divididas, como bem exposto por Ronaldo Batista Pinto.
4 - Descumprimento de Medidas Protetivas de Urgência não configura crime de desobediência (art. 330 do CP). Para a caracterização do crime de desobediência não é suficiente o simples descumprimento de decisão judicial, sendo necessário que não exista cominação de sanção específica. A Lei n. 11.340/06 determina que, havendo descumprimento das Medidas Protetivas de Urgência, é possível a requisição de força policial, a imposição de multas, entre outras sanções, inexistindo ressalva expressa no sentido da aplicação cumulativa do art. 330 do CP. Ademais, há previsão no art. 313, III, do CPP quanto à admissão da prisão preventiva para garantir a execução de Medidas Protetivas de Urgência nas hipóteses em que o delito envolver violência doméstica. Daí ressaí que, em respeito ao princípio da intervenção mínima, não se pode falar em tipicidade da conduta de desobedecer ordem judicial de imposição de Medidas Protetivas de Urgência. Nessa esteira: STJ, AgRg no AREsp 699.637/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, j. 27/04/2017; STJ, HC 394.567/SC, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, j. 09/05/2017.
5 - Cabe a impetração de "Habeas Corpus" contra decisão que aplica Medidas Protetivas de Urgência. Com efeito, já assentou o STJ: "A jurisprudência desta Corte admite a insurgência, na via do habeas corpus, contra a imposição de medidas cautelares diversas da prisão, a exemplo das medidas protetivas de urgência previstas na Lei Maria da Penha, haja vista que afetam a liberdade de locomoção do impetrante, podendo ser convertidas em prisão, em caso de descumprimento" (RHC 82.241/MG, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, j. 08/08/2017). De igual banda, RENATO BRASILEIRO DE LIMA assevera: "À primeira vista, poder-se-ia pensar que o habeas corpus somente seria cabível quando tivesse havido a decretação da prisão preventiva com fundamento no art. 313, III, do CPP. Porém, não se pode afastar o cabimento do writ para as demais medidas protetivas de urgência. Em primeiro lugar, porque a decretação de certas medidas protetivas de urgência acarreta algum tipo de constrangimento à liberdade de locomoção do agressor, como ocorre, por exemplo, com a proibição de frequentação de determinados lugares. Segundo, porque o descumprimento injustificado de uma dessas medidas pode ensejar a decretação da prisão preventiva com fundamento no art. 313, III, do CPP, o que acaba por evidenciar a existência de um risco, ainda que potencial, à liberdade de locomoção" (Legislação criminal especial comentada. 2. ed. Salvador: Editora Juspodivm, 2014. p. 923).
1 - A palavra da vítima basta para a concessão de Medidas Protetivas de Urgência. Realmente, em se tratando de casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, a palavra da vítima ganha especial relevo para o deferimento de Medidas Protetivas de Urgência, porquanto os delitos relacionados são cometidos, em regra, na esfera da convivência íntima e em situação de vulnerabilidade, sem que sejam presenciados por outras pessoas. E assim é que, em estando em conflito, de um lado, a preservação da integridade da vítima e, de outro, a irrestrita liberdade, em seu amplo aspecto, do suposto agressor, atende aos mandamentos da proporcionalidade e da razoabilidade a decisão que aplica medidas de restrição de direitos contra este último, tendo por base o relato da primeira. Nesse sentido: STJ, AgRg no AREsp 213.796/DF, Rel. Ministro CAMPOS MARQUES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/PR), QUINTA TURMA, j. 19/02/2013; STJ, RHC 34.035/AL, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, j. 05/11/2013.
2 - Não há necessidade de boletim de ocorrência, de inquérito ou de processo cível ou criminal para que sejam requeridas e concedidas Medidas Protetivas de Urgência. De acordo com o Tribunal da Cidadania: "As medidas protetivas previstas na Lei n. 11.340/2006, observados os requisitos específicos para a concessão de cada uma, podem ser pleiteadas de forma autônoma para fins de cessação ou de acautelamento de violência doméstica contra a mulher, independentemente da existência, presente ou potencial, de processo-crime ou ação principal contra o suposto agressor. [...] Nessa hipótese, as medidas de urgência pleiteadas terão natureza de cautelar cível satisfativa, não se exigindo instrumentalidade a outro processo cível ou criminal, haja vista que não se busca necessariamente garantir a eficácia prática da tutela principal. 'O fim das medidas protetivas é proteger direitos fundamentais, evitando a continuidade da violência e das situações que a favorecem. Não são, necessariamente, preparatórias de qualquer ação judicial. Não visam processos, mas pessoas' (DIAS. Maria Berenice. A Lei Maria da Penha na justiça. 3 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012) [...]" (REsp 1419421/GO, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, j. 11/02/2014).
3 - Há possibilidade de que, em breve, a Autoridade Policial possa diretamente conceder determinadas Medidas Protetivas de Urgência. Na sistemática atual, a concessão de medidas de proteção da Lei Maria da Penha é exclusividade do Magistrado. Quando a ofendida busca amparo na Delegacia de Polícia, seu pedido de Medidas Protetivas de Urgência deve ser encaminhado pela Autoridade Policial em 48 horas (art. 12, III, da Lei n. 11.340/06) e o Juiz deve decidir em também 48 horas (art. 18, I, da Lei n. 11.340/06). No entanto, o Senado Federal aprovou, em 10/10/2017, projeto que altera a Lei Maria da Penha para permitir que o Delegado de Polícia conceda certas Medidas Protetivas de Urgência a mulheres vítimas de violência doméstica e familiar e a seus dependentes. Nos termos do Projeto de Lei (PLC 7/2016), verificada a existência de risco atual ou iminente à vida ou integridade física e psicológica da vítima ou de seus dependentes, a Autoridade Policial, preferencialmente da Delegacia de Proteção à Mulher, poderá aplicar provisoriamente, até deliberação judicial, as Medidas Protetivas de Urgência previstas no inciso III do art. 22 e nos incisos I e II do art. 23 da Lei n. 11.340/06, intimando desde logo o ofensor. O texto do projeto em comento seguiu para a sanção presidencial. As opiniões a respeito do viés positivo ou negativo da mudança, não obstante, são divididas, como bem exposto por Ronaldo Batista Pinto.
4 - Descumprimento de Medidas Protetivas de Urgência não configura crime de desobediência (art. 330 do CP). Para a caracterização do crime de desobediência não é suficiente o simples descumprimento de decisão judicial, sendo necessário que não exista cominação de sanção específica. A Lei n. 11.340/06 determina que, havendo descumprimento das Medidas Protetivas de Urgência, é possível a requisição de força policial, a imposição de multas, entre outras sanções, inexistindo ressalva expressa no sentido da aplicação cumulativa do art. 330 do CP. Ademais, há previsão no art. 313, III, do CPP quanto à admissão da prisão preventiva para garantir a execução de Medidas Protetivas de Urgência nas hipóteses em que o delito envolver violência doméstica. Daí ressaí que, em respeito ao princípio da intervenção mínima, não se pode falar em tipicidade da conduta de desobedecer ordem judicial de imposição de Medidas Protetivas de Urgência. Nessa esteira: STJ, AgRg no AREsp 699.637/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, j. 27/04/2017; STJ, HC 394.567/SC, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, j. 09/05/2017.
5 - Cabe a impetração de "Habeas Corpus" contra decisão que aplica Medidas Protetivas de Urgência. Com efeito, já assentou o STJ: "A jurisprudência desta Corte admite a insurgência, na via do habeas corpus, contra a imposição de medidas cautelares diversas da prisão, a exemplo das medidas protetivas de urgência previstas na Lei Maria da Penha, haja vista que afetam a liberdade de locomoção do impetrante, podendo ser convertidas em prisão, em caso de descumprimento" (RHC 82.241/MG, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, j. 08/08/2017). De igual banda, RENATO BRASILEIRO DE LIMA assevera: "À primeira vista, poder-se-ia pensar que o habeas corpus somente seria cabível quando tivesse havido a decretação da prisão preventiva com fundamento no art. 313, III, do CPP. Porém, não se pode afastar o cabimento do writ para as demais medidas protetivas de urgência. Em primeiro lugar, porque a decretação de certas medidas protetivas de urgência acarreta algum tipo de constrangimento à liberdade de locomoção do agressor, como ocorre, por exemplo, com a proibição de frequentação de determinados lugares. Segundo, porque o descumprimento injustificado de uma dessas medidas pode ensejar a decretação da prisão preventiva com fundamento no art. 313, III, do CPP, o que acaba por evidenciar a existência de um risco, ainda que potencial, à liberdade de locomoção" (Legislação criminal especial comentada. 2. ed. Salvador: Editora Juspodivm, 2014. p. 923).
Como citar este texto:
LEAL, Fábio Gesser. CINCO coisas que você como Operador do Direito não pode desconhecer sobre as MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA da LEI MARIA DA PENHA. Recinto do Direito [blog]. Braço do
Norte/SC, out. 2017. Seção Direito Penal. Disponível em: <https://recintododireito.blogspot.com.br/2017/10/cinco-coisas-que-voce-como-operador-do.html>.
Acesso em:
Em relação ao Item 3, tal possibilidade restou vetada pelo Presidente da República.
ResponderExcluirPresidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos
MENSAGEM Nº 436, DE 8 DE NOVEMBRO DE 2017.
Senhor Presidente do Senado Federal,
Comunico a Vossa Excelência que, nos termos do § 1o do art. 66 da Constituição, decidi vetar parcialmente, por inconstitucionalidade, o Projeto de Lei no 7, de 2016 (no 36/15 na Câmara dos Deputados), que “Acrescenta dispositivos à Lei no 11.340, de 7 de agosto de 2006 (Lei Maria da Penha), para dispor sobre o direito da mulher em situação de violência doméstica e familiar de ter atendimento policial e pericial especializado, ininterrupto e prestado, preferencialmente, por servidores do sexo feminino”.
Ouvidos, o Ministério da Justiça e Segurança Pública e a Secretaria Nacional de Políticas para as Mulheres, da Secretaria de Governo da Presidência da República, manifestaram-se pelo veto aos seguintes dispositivos:
Caput e §§ 1º e 2º do art. 12-B, da Lei no 11.340, de 7 de agosto de 2006 (Lei Maria da Penha), acrescidos pelo art. 2o do projeto de lei
“Art. 12-B. Verificada a existência de risco atual ou iminente à vida ou à integridade física e psicológica da mulher em situação de violência doméstica e familiar ou de seus dependentes, a autoridade policial, preferencialmente da delegacia de proteção à mulher, poderá aplicar provisoriamente, até deliberação judicial, as medidas protetivas de urgência previstas no inciso III do art. 22 e nos incisos I e II do art. 23 desta Lei, intimando desde logo o agressor.
§ 1o O juiz deverá ser comunicado no prazo de 24 (vinte e quatro) horas e poderá manter ou rever as medidas protetivas aplicadas, ouvido o Ministério Público no mesmo prazo.
§ 2o Não sendo suficientes ou adequadas as medidas protetivas previstas no caput, a autoridade policial representará ao juiz pela aplicação de outras medidas protetivas ou pela decretação da prisão do agressor.”
Razão dos vetos
“Os dispositivos, como redigidos, impedem o veto parcial do trecho que incide em inconstitucionalidade material, por violação aos artigos 2o e 144, § 4o, da Constituição, ao invadirem competência afeta ao Poder Judiciário e buscarem estabelecer competência não prevista para as polícias civis.”
Essa, Senhor Presidente, a razão que me levou a vetar os dispositivos acima mencionados do projeto em causa, a qual ora submeto à elevada apreciação dos Senhores Membros do Congresso Nacional.
Este texto não substitui o publicado no DOU de 9.11.2017